bate-boca saudável

Longe de mim criar um blog para impor opiniões, doutrinas e ideologias. É fato que quem escreve sobre assuntos polêmicos deve assumir uma posição e defendê-la arduamente, considerando as contra-argumentações recebidas como fonte de repertório e não de possíveis desavenças. Todos que se interessarem são bem-vindos

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Alegria: as bruxas continuam soltas...

Quando Mario Sérgio Cortella, em "Não nascemos prontos", fez um brilhante ensaio filosófico e o entitulou 'Alegria: as bruxas continuam soltas...' se deteve a expor as mazelas de um mundo extremamente célere, materialista e racionalista. O título remonta um cenário na idade média em que eram considerados 'bruxos' os que preservavam tradições ritualísticas que não condiziam com as práticas católicas. Eram perseguidos e , com consentimento dos cidadãos, que tinham seus juízos induzidos, mortos - geralmente as execuções aconteciam em praças públicas, os autos de fé, que contribuíam para a intimidação popular. Tinham muita legitimidade por propagarem virtudes, príncipios e valores; no entanto, pedófilos, frequentadores de prostíbulos, estelionatários - já que cobravam dízimos e indulgências para garantir um lugar no "céu" - eram em grande número constituintes das dioceses. Isso transposto a conjuntura atual parece muito com o discurso dos militantes esquerdistas. Doutores em aparentar ser, arrecadam votos de cabresto pelas esmolas públicas e restituem os autos de fé nos debates políticos, quando ameaçados por uma oposição mais entendida - e as demagogias massificantes garantem o sucesso dos inquisidores. Suas propostas humanitárias e comunitárias, além de falsas, mesmo no papel confundem o imaginário com o real: o povo acostumado em transgredir as barreiras da abstração (novelas, programas de auditório), as muitas idéias que não podem se materializar - bastando conhecer o mínimo sobre a filosofia platônica e suas discidentes, tem-se claro que poucos conceitos podem se constituir integralmente e nenhum por meio das matemáticas - acabam ganhando fôlego pela alienação social. O problema é que as bruxas estão se extinguindo; nem mais caladas mas cansadas.

domingo, 7 de março de 2010

Classe C , graças a Deus.


A competitividade aumentou - e muito. Lógico que a tecnologia induz facilmente ao desemprego estrutural, assim como a crise fez ressurgir o tão esquecido desemprego conjuntural. Mas o fator preponderante da corrida empreendedorista se dá a partir das políticas sociais aplicadas no atual governo. Essas que já foram consideradas pelos reacionários enfermidades por enrustir, de forma efêmera e ilusória, a miséria e a precariedade , através das migalhas do Estado. Hoje , no entanto, agrada a todas as vertentes políticas : a esquerda comandante se alimenta dos votos de cabresto - ou seja, arrecada o consentimento do povo por meio da mamata no fim do mês, mais conhecida como bolsa assistencialista; e a direita vê se establizar e se alia a uma tacocracia, cada vez menos questionada, que institui uma concorrência mercenária - nas universidades, indústrias, empresas - , mas que faz o mercado supervalorizar e o capital ser exclusivo sustentador do consumismo. Daí a classe C, como dizem os especialistas. Emergentes, eu diria. São aqueles que não se acomodaram no colo estatal - por falta de opção ou astúcia, tanto faz - e disputam um espaço no agora mais compacto mercado de trabalho. Cursos técnicos, profissionalizantes ou de licenciatura são os mais procurados - rápidos e práticos, de acordo com a conjectura atual. Não há mais tempo para faculdades longas, pesquisas abstratas; todas as células precisam estar , ininterruptamente, em contato atmosférico; sem se vincular ao mundo metafísico, as ações automaticamente se tornam materialistas e extremamente racionalistas. Mas, para alívio do governo e para manutenção da boa figura internacional, a classe C continua a enfrentar seus demônios, normalmente caladas pelo deleite da política "pão e circo" da mídia. Portanto, oremos.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Nostalgia energizante.


Epifanias produtivas geralmente vêm das mudanças de ares - viaje,pesquise,leia,mude, que faz bem. Numa dessas conversas de domingo a noite - nesse caso, era terça - , durante a janta, põe-se em voga curiosidades juvenis e nostalgias antigas. Meu ponto não são os detalhes - por mais belos que sejam - , mas um contexto lírico - e não piegas - em que se colocavam os maiores prazeres da vida. Sexo não no sentido físico, psicológico nem químico, mas social. Às vezes, alguns se perguntam quais seriam bons tópicos a serem abordados numa poesia; imagino que esse seria um ótimo. Num mundo em que as leis eram obedecidas por respeito à família ( o que se chama hoje de boa educação ), o acesso díficil ao conforto e praticidade impediam a comunidade de cair na ostentação pífia e conformidade mórbida. Uma história que durou até metade dos anos 80, e que serviu de base para entender uma estória - tão puculiarmente antiga, que caberia naqueles romances atemporais. Como se estivessemos numa noite de carnaval numa capital brasileira, as escolas de samba se preparavam para mostrar enredos envolventes, sonoridade adequada, figurinos exuberantes (não eróticos). Só para constar, isso não é luxúria burguesa; muito diferentemente, é conservação das tradições ritualísticas e valorização das raízes culturais. E ainda: as classes socias eram ainda mais evidentes; sem serem classificadas por ordem exclusivamente econômica, descriminavam-se grupos em que interesses, valores, planos comunmente interagiam e convergiam. Voltando: a rainha do baile era pretendida por vários garotos, que disputavam sua companhia por meio da simpatia com seus pais, demonstrações cavalheirísticas, vestimentas apuradas, e outros. Isso quando a garota se apresentava a sociedade como mulher ( debutante) e , a partir dali, quando se acomodava com o bem escolhido, começava a seção calorosa. Calma lá, não vá imaginar coisas. Funcionava diferente naquela época: a honra de ser selecionado não garantia êxito amoroso. Os encontros eram raros ( por isso esperados, pensados ) e cada movimento tendencioso era maquinalmente efetuado, com precisão milimétrica de espaço, intensidade, tempo; e , o melhor de tudo, era aproveitado a musicalidade do momento, sentido a pressão arterial subir e o sistema nervoso induzir gastrite e suor, degustado da saliva pretenciosa de imaginações pelo simples olhar do joelho, pelo toque das mãos, cheiro do pescoço, ou aproximação interfacial. Depois, é obvio que iam perdurar muito mais relacionamentos duradouros, famílias estruturadas, ...

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Veja essa

"Quando comecei a gravar aqueles boletins, comentava com o pessoal da produção: 'Gente, acho que na vida real não é bem assim'. E me diziam: 'Relaxa, isso aqui é novela, é entretenimento'. Então, relaxei."

Camila Morgado, a Malu de Viver a vida, uma comentarista econômica que não prima pela sagacidade.

Veja, 24 de fevereiro de 2010

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Isolamento mórbido


No começo do século XX, em meio ao fervoroso processo de industrialização das metrópoles, um grupo de literatos - depois denominado 2 geração romântica - desenvolveu uma vertente mais intimista, melancólica e , acima de tudo, pessimista no romantismo. Era uma tentativa de amenizar, por meio da literatura, as consequências de uma conjectura turbulenta, competitiva; buscava-se encorajar a comunidade a enfrentar seus demônios, angústias que , antes suprimidos devido a uma demanda obcessiva, vinham a causar sérios transtornos pessoais. Desde então, a procura por analistas - seja psicólogo, psicanálista, psiquiatra - cresceu vertiginosamente na tentativa de apaziguar, deliberar um complexo intrínseco. No Japão, atualmente, entre os homens, estima-se que 50 mil- os hikikomoris -( entre 18 e 34 anos) preferem se enclausurar em casa, vivendo apenas na fantasia dos seus games, a fim de evitar contato com um exterior demasiadamente célere e usurpador. Não precisa ir muito longe para ver os efeitos dessa tacocracia. No Brasil, o número de solteiros se multiplicou; geralmente jovens e adultos reclusos em apartamentos - verdadeiras fortificações para proteção contra os escombros modernos ou, como se diz, violência implácavel - preservam uma rotina compensatória à rescisão social, relacionamentos efêmeros e um pouco das atrações descontraídas ( na verdade, erotizantes) urbanas. As famílias - as que ainda não se desmantelaram - não conseguem manter um convivío, se perto; nem os ritos tradicionais, se longe.Não tem mais Páscoa, Natal. Isso porque ainda há familias; daqui a pouco serão só grupos, clãs com interesses convergentes. É um por todos e todos pro inferno.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Metalingüagem, com trema mesmo



Quando Platão , em "A República", criticava os poemas histórico-românticos de Homero, e mostrava-lhe a distorção que fazia em suas obras, dividiu-se, finalmente, os dois hemisférios, anteriormente mal conectados : o mundo sensível e o mundo inteligível. No começo, apreciara-se essa descoberta como meio de se obter a essência das coisas, a verdade efetiva dessas mesmas - posteriormente denominada por Descartes ; enfim, esboçava-se a ciência. Como os filósofos, segundo Olavo de Carvalho, orientam suas teorias com base na crítica de seus antecessores, o universo dos pensadores se fragmentou. A linguagem, no entanto, permaneceu naturalmente sendo usada por todos a fim de demonstrar os estudos feitos. E ela , mesmo que poucos se sintam confortáveis com isso, pode assumir várias funções em diferentes textos. A produção mais abstrata ,por sua vez, aproveitou mais essa flexibilidade linguística. Os processos verbais e não verbais, em linhas gerais, distanciam-se na formalidade; porém, no fim, aconchegam-se entre a mente e a alma : ás vezes pelas nuvens; outras, pelo fogo ardente. Esses encontros surgem da capacidade metafísica das letras ou desenhos; remontam os outros 4 sentidos, as sensações, desejos, sentimentos no ethos - palavra grega que traduzida como " o mundo inteligível". No campo dialético, a maleabilidade das palavras , sempre influente, fez germinar diferentes clãs com forte potencialidade de brotamento. Os céticos - grupo de "pensadores" que duvidavam de tudo - usavam da imprecisão, recorrente no estudo imaterial, pois acreditavam ser impráticavel aprofundamentos filosóficos. Já os sofistas - conhecidos pela arte de convencer sem ter razão - , esses sim, manipularam mais profundamente as nuânces da escrita a seu favor; maleabilidade sintática, sêmica, foram recursos amplamente utilizados pela sua erística.

Adaptação ou substituição?

"Não troque as bolas!". "Não ponha os pés pelas mãos". São expressões antigas ( mas atualizadas) que traduzem o contexto sociocultural do século XXI - porém, parece estar se diluindo. Na própria língua é dose, mas há. Agora o povo manda no idioma. Democrático não?! Ladainha, poxa. Há especialistas, profissionais que trabalham nesse campo do conhecimento e deveriam se impor, aplicando regras que convém com a logística da ciência, em vez de se submeter ao bate-boca popular. Ninguém tem que usar a norma culta da língua numa prosa de bar; mas não se pode expremer ,no dicionário, significados em palavras que já possuem seu "locus" específico ( como o caso do artigo "Arte: quase que sem artistas" ). Gostei da moda, da música ( mesmo sendo piegas e repetitiva), que adaptaram suas raízes de forma original. A literatura ( graças a deus , salva da 1 geração modernista), o cinema ( mesmo abobado com os efeitos especiais e desnorteado da exploração mental) também resolveram dar valor a historicidade.Existem coisas que não se alteram - ou não deveriam ser modificadas -, estão perfeitamente estáveis. Coerência, palavrinha mágica do dia. Vai ver é uma época boa para entrar nesse ritmo: agora, menos tóxico.